Ele lutava contra um câncer desde 2011 e passou por
tratamento em Cuba.
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, morreu na tarde desta terça-feira (5), aos 58 anos, na
capital Caracas. Ele lutava contra um câncer desde junho de 2011 e, após
realizar um tratamento em Cuba contra a doença, havia voltado ao país natal em
fevereiro deste ano.
Chávez foi um dos
mais destacados e controversos líderes da América Latina. Desde que assumiu o
comando da Venezuela, em 1999,
o militar da reserva promoveu mudanças à esquerda, na política e na economia.
Ele nacionalizou empresas privadas, atribuiu ao Estado atividades essenciais,
além de mudar a Constituição, o nome, a bandeira e até o fuso horário do país
(1h30 a menos que o horário de Brasília).
Chávez foi reeleito
pela primeira vez em 2006, com mais de 62% dos votos, e novamente em 2012, com
54%. Ele tentou chegar ao poder pela primeira vez em 1992 através de uma
tentativa fracassada de golpe de Estado, que fez com que fosse preso. Em 2002,
já no comando do país, sofreu um golpe de Estado que o tirou do poder por quase
48 horas. Foi restituído por militares leais, com a mobilização de milhares de
seguidores.
A Venezuela, que é membro da
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), possui uma economia
dependente das exportações do combustível, tendência que Chávez queria mudar
com a entrada do país no Mercosul. O país tem 30 milhões de hectares de terras
cultiváveis, mas importa até 70% dos alimentos que consome. A população é de
quase 29 milhões de habitantes.
DOENÇA
- Desde que foi reeleito mais uma vez,
em outubro de 2012, o líder venezuelano apareceu em público poucas vezes, a
maioria delas para liderar conselhos de ministros no Palácio de Miraflores.
Chávez também deixou de utilizar frequentemente sua conta na rede social
Twitter. A falta de informações e detalhes sobre a doença e a presença menos
frequente de Chávez em eventos desde que anunciou a luta contra o câncer
alimentaram os rumores de que seu estado de saúde poderia ser mais grave do que
o governo queria divulgar.
Em 10 de junho de 2011, a imprensa
venezuelana noticiou que Hugo Chávez havia por uma cirurgia de emergência em Cuba devido a um problema na região pélvica. Rumores sobre a
doença circularam nos dias seguintes, mas o governo venezuelano negou que se tratasse de um tumor.
Em 30 de junho, no
entanto, o presidente confirmou que havia sido operado em razão de um câncer. Não foram revelados maiores detalhes sobre a doença. Chávez
voltou à Venezuela dias depois e voltaria a Cuba nos meses seguintes para
sessões de quimioterapia. Em agosto de 2011, apareceu com o cabelo raspado: "É meu novo visual", disse.
Em outubro do mesmo ano, após fazer
exames médicos em Cuba, o governante declarou-se livre do câncer. "O novo Chávez voltou [...] Vamos viver e vamos
continuar vivendo. Estou livre da doença", afirmou, fardado e eufórico.
Hugo Chávez chegou
a dizer que o câncer, que atingiu cinco líderes sul-americanos – entre eles a
presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula – teria sido induzido pelos Estados Unidos. "Não seria estranho se tivessem desenvolvido uma
tecnologia", disse. Em fevereiro de 2012, ele anunciou que seria operado
novamente por uma lesão na mesma região em que teve o tumor removido. A
cirurgia também ocorreu em Cuba e, posteriormente, ele passou por tratamento de
radioterapia.
Em julho, quando era candidato à
reeleição, o presidente voltou a dizer que havia vencido a batalha contra o
câncer. Aos opositores, Chávez dizia que seus problemas de saúde não o
impediriam de vencer a eleição que poderia mantê-lo no poder até 2019.
Em novembro, após
vitória nas urnas, a Assembleia Nacional autorizou a viagem de Chávez a Cuba para receber terapia hiperbárica, um tratamento complementar comum em pacientes que
receberam radioterapia.
Em dezembro, Chávez
anunciou que voltaria a Cuba para ser submetido a uma nova cirurgia devido ao
retorno do câncer. Ele designou o vice, Nicolás Maduro, como o eventual sucessor se
não fosse capaz de voltar ao poder. Foi a primeira vez que Chávez admitiu,
publicamente, que a doença poderia impedi-lo de seguir à frente do país. Após a
realização da cirurgia, foi Maduro quem passou a fazer relatos do estado de
saúde de Hugo Chávez. A oposição criticava o governo, acusando-o de sonegar
informação sobre a real situação do mandatário.
Chávez não conseguiu tomar posse de
seu novo mandato, em 10 de janeiro. Após disputa judicial, o Tribunal Superior
de Justiça entendeu que a presença dele não era necessária, e que uma posse
formal poderia ocorrer em outra data a ser marcada posteriormente.
Em 18 de fevereiro,
surpreendendo a todos, Hugo Chávez anunciou, pelo Twitter, que estava voltando
à Venezuela. Ele foi diretamente para um hospital militar na capital Caracas.
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Hugo Chávez lidera o último comício antes das eleições do dia 8 de novembro de 1998, na capital venezuelana |
Desde que venceu as primeiras
eleições presidenciais, em 1999, com a promessa de pôr fim à
"partidocracia corrupta" em que o governo havia se transformado e de
distribuir a renda do petróleo entre os setores excluídos da sociedade, o
presidente assumiu um estilo único de fazer política. Ele chegou ao poder em
fevereiro daquele ano como o 47º presidente da Venezuela, jurando sobre uma
Constituição que ele afirmou estar "moribunda".
Entre suas primeiras decisões, proibiu
que o Departamento Antidrogas dos Estados Unidos fizesse sobrevoos no país e,
anos mais tarde, em 2008, expulsou o embaixador americano. No final de 1999,
alcançou o seu objetivo de mudar a carta magna da Venezuela e iniciar o que
chamou de "Revolução Bolivariana".
CRISES POLÍTICAS - Chávez enfrentou momentos difíceis no poder, como
quando, depois de vários dias de greves nacionais, em 11 abril de 2002, sofreu
um golpe de Estado que o tirou do poder por quase 48 horas. Após tumultos e 19
mortes, o líder venezuelano foi restituído ao cargo por militares leais, com a
mobilização de milhares de seguidores pelas ruas de Caracas.
Naquele mesmo ano,
uma greve liderada por trabalhadores, empregadores e contratados da estatal de
petróleo de Venezuela paralisou a indústria vital para o país. A greve
prolongou-se até fevereiro de 2003 e derrubou a produção petrolífera,
impactando com força a economia.
Os trabalhadores
criticavam a implantação do projeto de "grande revolução
bolivariana", que atingiu proprietários de terras, produtores de combustíveis
e bancos. O termo é referência ao líder revolucionário Simón Bolívar,
responsável pela independência de vários países da América do Sul, em quem
Chávez dizia se inspirar.
Em 2004, após
violentos protestos da oposição que deixaram outros nove mortos, Chávez
submeteu-se novamente a um referendo público que o confirmou no poder.
REELEIÇÃO
EM 2006 - Em 2006, em nova eleição
presidencial, ele obteve 62% dos votos contra o opositor Manuel Rosales. No
novo mandato, Chávez declarou a transformação da Venezuela em um Estado
socialista. Durante este período, o militar reformado iniciava seu projeto de
estatização da maioria das empresas venezuelanas, em setores cruciais como
telecomunicações e eletricidade. Em maio de 2007, a Radio Caracas Television,
emissora mais antiga da Venezuela, encerrou suas transmissões após não ter sua
concessão renovada pelo governo.
Iniciava-se também sua tentativa de
reforma na Constituição, que permitira sua reeleição por tempo indefinido. Após
uma primeira derrota, ocorrida no final de 2007, o projeto foi aprovado em
referendo popular em fevereiro de 2009. Em 2010, Chávez sofreu sua primeira
derrota nas urnas, em eleições legislativas. Apesar de ter obtido a maioria dos
votos, seu partido não conseguiu dois terços da Assembleia Nacional
venezuelana, objetivo necessário para facilitar a aprovação dos projetos do
governo.
Com uma manobra política, no entanto,
conseguiu aprovar um dispositivo que o permitiu governar por mais seis meses
por decretos de emergência.
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Hugo Chávez e o então presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, conversam com um agricultor em visita a uma plantação de soja em El Tigre, na Venezuela, em outubro de 2009 |
"Faz tempo que a Venezuela devia
entrar no Mercosul. Mas como está escrito na Bíblia, tudo o que vai ocorrer sob
o sol tem sua hora", disse Chávez à ocasião. "Nos interessa muito
sair do modelo petroleiro, impulsionar o desenvolvimento agrícola da Venezuela
[...] Temos disponíveis mais de 30 milhões de hectares para o desenvolvimento
da agricultura", afirmou.
O ministro das
Relações Exteriores brasileiro, Antonio Patriota, disse em setembro de 2012 que
"houve unanimidade no Mercosul e Unasul para a suspensão do
Paraguai. O que reforçou a suspensão foi
o fato de todos os países, como gesto de repúdio, retiraram seus embaixadores,
o que não ocorreu em Caracas, na Venezuela".
Com o ingresso da
Venezuela, o Mercosul passou a contar com população de 270 milhões de
habitantes, ou 70% da população da América do Sul. Segundo o Ministério de
Relações Exteriores brasileiro, o PIB do bloco será de US$ 3,3 trilhões (83,2%
do PIB sul-americano), com território de 12,7 milhões de km² (72% da área da
América do Sul).
REELEIÇÃO
EM 2012 - Em 7 de outubro, Chávez derrotou
Henrique Capriles Radonski, mesmo com uma campanha limitada, e garantiu novo
mandato, o quarto consecutivo, até 2019, prometendo "radicalizar" o programa socialista que vinha
implantando no país.
O presidente teve
cerca de 54% dos votos, contra 45% do oponente, e o comparecimento às urnas foi
de quase 81%. Dilma disse na ocasião que a vitória foi um "processo democrático exemplar".
Durante a campanha, Chávez pediu a
vitória para tornar "irreversível" o seu sistema socialista e
acelerar o Estado comunista, algo que os críticos veem como uma nova manobra
para concentrar mais poder em suas mãos. Ele não hesitou em falar em uma
“ameaça de guerra civil” caso o rival ganhasse as eleições. Capriles foi o
primeiro adversário a ter chances reais de derrotar Hugo Chávez, ao capitalizar
o descontentamento acumulado durante os mandatos do presidente. Em conversa com
o G1 na época, ele disse que seguiria o modelo brasileiro caso fosse
eleito.
Além de ser comandante-em-chefe das
Forças Armadas e presidente do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV),
com maioria na Assembleia Nacional, Hugo Chávez também controlava a mídia
estatal.
POLÍTICA EXTERNA - A política externa foi inspirada pelo líder cubano Fidel
Castro e marcada por críticas contra o "imperialismo" dos Estados
Unidos, país que ele acusa de ser responsável pelo breve golpe que sofreu em
2002 e por questões que vão desde a mudança climática até uma suposta tentativa
de assassiná-lo. Durante sua gestão, Hugo Chávez reforçou a cooperação com seus
aliados de esquerda na América Latina como Bolívia, Equador, Nicarágua, além de
tecer parcerias com os governos polêmicos de Irã, Síria, Belarus, Líbia, entre
outros. Ele foi pragmático o suficiente, entretanto, para continuar a vender
diariamente para os Estados Unidos um milhão de barris de petróleo.
Com os seus "petrodólares",
estabeleceu iniciativas regionais como o grupo de coordenação política
Alternativa Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba) e subsidiou o
petróleo da Petrocaribe, aliança entre alguns países do Caribe com a Venezuela.
O presidente venezuelano tratava outros líderes internacional com intensidade,
respeito ou desprezo, chegando a dizer que havia sentido cheiro de
"enxofre" na tribuna da Assembleia Geral da ONU, em 2007, após ter
passado pelo então presidente americano, George W. Bush, que já foi chamado por
Chávez de bêbado e genocida.
Barack Obama, a quem Chávez
parabenizou pela eleição em 2008, foi taxado mais tarde de
"farsante". Quando Obama foi reeleito em outubro deste ano, o venezuelano
disse desejar que o americano "se dedique a governar seu país, deixando de invadir povos
e desestabilizar países". Chávez
tinha apreço especial por Lula e Dilma devido ao histórico de combate dos
brasileiros durante a ditadura militar. "Eu e Lula somos irmãos. Somos
mais que irmãos. Somos, como já disse Fidel Castro, esses tipos que andam por
aí fazendo coisas, como Dilma, Cristina [Fernandez, presidente da Argentina],
Néstor [Kirchner, ex-presidente argentino]”, disse Hugo Chávez, durante a primeira visita oficial da
presidente brasileira à Venezuela.
POPULISMO - Hugo Chávez manteve-se no poder graças à implementação das
suas "missões", programas sociais que melhoraram os níveis de
educação e saúde públicas venezuelanas, embora a pobreza, o desemprego e a violência
tenham se espalhado pelo país, que possui uma das maiores reservas de petróleo
da região. Sua popularidade contrastava com a rejeição vinda da classe média,
afetada pelas restrições econômicas impostas em nome da revolução e por
políticas de desapropriação de empresas privadas.
Seu discurso beligerante polarizou a
sociedade ao demonizar os oponentes e queimar todas as pontes de entendimento
com a outra metade do país – politicamente, uma estratégia muito rentável,
admitem fontes próximas ao governo.
Viciado em
comunicação, convocava constantemente a cadeia nacional de rádio e TV para
longos discursos, além de comandar por muito tempo o programa semanal
"Alô, Presidente", no qual discutia suas ideias políticas, recebia
convidados para entrevistas, entregava obras públicas e até vendia
eletrodomésticos chineses com preços subvencionados pelo governo. Tornou-se
também um grande usuário do Twitter, onde reunia milhares de seguidores, mas
diminuiu o uso do microblog após a eleição de 2012.
FONTE:
GLOBO.COM
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