Nos últimos 12 meses, foram executados nos cárceres do
Maranhão 59 presos. Desde outubro, por decisão da governadora Roseana Sarney, o
sistema prisional maranhense encontra-se em “estado de emergência”. O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, cobra explicações e ameaça
requerer ao STF uma intervenção federal. Em meio a esse cenário caótico,
o senador José Sarney encontrou algo para celebrar.
“Aqui no Maranhão, nós conseguimos que a violência não saísse dos
presídios para a rua”, disse o pai da governadora. “Por exemplo: o Espírito
Santo não teve Carnaval no ano passado, porque as rebeliões nos presídios… eles
[os presos rebelados] determinaram que não poderia ter Carnaval. E não se fez,
porque tocaram fogo em ônibus, tocaram fogo na cidade, quabraram tudo. E nós
temos conseguido que aqui essa coisa não extrapole para a própria sociedade.”
Pronunciadas numa entrevista à Rádio Mirante AM,
uma das emissoras que compõem o império estadual de comunicação da família, as
declarações de Sarney ajudam a entender por que as cadeias brasileiras
abandonaram o ideal da ressocialização para virar centros de violação dos
direitos humanos. O que o senador disse, com outras palavras, foi o seguinte: a
carnificina nas cadeias é um mal menor, desde que não perturbe “a própria
sociedade”. É como se na cabeça de políticos como Sarney os presos não fizessem
parte da sociedade.
Veiculada no dia 24 de dezembro, a entrevista de Sarney teve como
pretexto a divulgação de uma mensagem natalina do senador. A alturas tantas o
entrevistador perguntou ao patrono da rádio se ele acredita na hipótese de
decretação de intervenção federal no Maranhão. O pai da governadora evitou dar
uma resposta direta, do tipo sim ou não. Preferiu vaguear ao redor do tema.
Espremendo-se as digressões conclui-se: 1)
para Sarney, a encrenca é nacional, não maranhense. 2) há múltiplos
culpados, nenhum deles se chama Roseana.
Uma das mazelas que convulsionam o maior presídio
do Maranhão, o complexo penitenciário de Pedrinhas, é a guerra entre facções
criminosas rivais. Juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de
Justiça, Douglas de Melo Martins afirma que isso acontece porque o cadeião de
Pedrinhas, localizado em São Luís, recebe presos de todo o Estado. Os detentos
do interior disputam poder no xadrez com os criminosos da capital.
Alheio às observações do doutor Douglas, Sarney
agarra-se a uma tese própria. Para ele, a culpa é da eficiência da polícia dos
Estados desenvolvidos. “Quando se aperta no Sul do país, que tem mais dinheiro,
eles apertam as quadrilhas, elas vêm pra cá, pro Norte. E começam, então, a
agir aqui nos termos que agem no Sul, formando nos presídios grupos, comandos,
um enfrentando o outro, um querendo liquidar o outro…” No linguajar simples do
sertanejo, “o Sul” engloba sobretudo Estados como São Paulo e Rio, ambos do
Sudeste. O “Norte” são todos os pedaços pobres do mapa brasileiro, a maioria
localizada no Nordeste.
A certa altura, Sarney olhou para o problema com
uma “visão estrutural”. Foi quando afirmou: “…A violência não cresceu só no
Maranhão. Ela cresceu assustadoramente no Brasil inteiro.” Citando dados que
disse ter lido num relatório oficial, o senador informou que 70% dos
responsáveis por homicídios têm entre 18 e 24 anos. “Quer dizer: os moços estão
se matando e estão matando. Por quê? Quase todos por drogas.”
A grande motivação dos homicidas, prosseguiu
Sarney, é ter acesso às drogas, principalmente o crack, que é mais barato.
“Antigamente, a maconha não chegava a dar essas loucuras que o crack dá… Ela
era cara. A cocaína, num Estado como o Maranhão, nem se fala. Era muito cara.”
No dizer de Sarney, o crack “tem uma influência direta na parte de segurança e
na criminal.”
O problema é “de difícil solução”, afirmou Sarney,
tropeçando no óbvio. Mas Roseana faz o que pode. Ao isentar a filha de culpas,
Sarney se expressa no plural. “Eu acredito que estamos fazendo tudo o que
podemos com o recursos que temos. O Maranhão é um Estado pobre. Estava vendo
hoje o nosso orçamento: R$ 14 bilhões. Esse orçamento do Maranhão equivale a um
quinto do orçamento da cidade de São Paulo, que não tem 217 municípios, não tem
217 redes hospitalares, não tem nada disso.”
Em matéria de segurança pública, o Maranhão é o
Estado mais extraordinário que Sarney já viu. Espécie de ex-tudo da política
nacional —de deputado estadual a presidente da República— Sarney retoma o
singular para jactar-se de ter sido o governador que colocou o Maranhão no que
chama de caminho certo: “Eu posso ficar feliz porque eu vi que nós tínhamos que
abrir a estrada e construímos tudo o que era necessário.”
Com sua desconversa, Sarney transita entre o duvidoso e o indelicado. É
duvidoso ao afirmar que a guerra na cadeia não atinge a rua. “Rebelião em
presídio espalha medo entre os moradores de São Luís”, informava em 10 de
outubro de 2013 notícia veiculada
pela Agência Brasil, estatal vinculada ao governo companheiro de Dilma
Rousseff. Sarney é indelicado quando arrasta para a encrenca doméstica o
longínquo Espírito Santo, Estado que se encontra sob águas. O Carnaval de 2012,
que Sarney diz ter sido revogado pela bandidagem capixaba, transcorreu
normalmente. A escola de samba Boa Vista sagrou-se campeã com o enredo ‘Vida em
Poesia – a Lira que é Lucinda.” Em segundo lugar ficou a Mocidade Unida da Glória.
Fonte: Blog do Josias
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