Este domingo (15) marca exatos 20 anos da aprovação da Emenda
Constitucional (EC) nº 4/1993, que criou o princípio da anualidade eleitoral. A
emenda deu nova redação ao artigo 16 da Constituição Federal para garantir que
mudanças na legislação eleitoral somente entrem em vigor se aprovadas até um
ano antes do pleito.
A redação original do artigo 16 determinava apenas que “a lei que
alterar o processo eleitoral só entrará em vigor um ano após sua promulgação”.
Com a nova redação, o dispositivo passou a determinar que “a lei que alterar o
processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando
à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.
A EC 4/1993 teve origem na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº
45/1991, de autoria do deputado Genebaldo de Souza Correia (PMDB-BA). No
entanto, a redação final do texto foi a sugerida pelo senador Josaphat Marinho
(PFL-BA). Essa foi a primeira PEC à Constituição de 1988 levada para votação na
Câmara dos Deputados. Após passar pelo Senado Federal, foi promulgada no dia 14
de setembro de 1993 e publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte.
CONTEXTO HISTÓRICO - O ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Walter Costa Porto
recorda que, no passado, uma infinidade de leis eram sancionadas para regular
um pleito no mesmo ano ou até mesmo dias antes da eleição. “Era, em verdade, um
mau costume brasileiro o de editar normas bem próximas aos pleitos, alterando a
cena eleitoral”, afirma.
Por exemplo, o segundo Código Eleitoral brasileiro
- a Lei n° 1.164, de julho de 1950 - regulou as eleições do dia 3 de outubro
daquele ano. A Lei n° 2.550, de 25 de julho de 1955, que alterou dispositivos
do Código Eleitoral, e a Lei n° 2.582/1955, que instituiu a cédula única de
votação, foram aplicadas às eleições realizadas em outubro do mesmo ano de
aprovação das duas normas.
Mesmo antes, em 1945, com o fim do Estado Novo, a
Lei Constitucional n° 9/1945, decretada por Getúlio Vargas em fevereiro,
estabelecia um prazo de 90 dias para a fixação, em lei, das datas das eleições
para o segundo período presidencial. Já o Decreto Lei n° 7.586, do dia 28 de
maio de 1945, marcou para o dia 2 de dezembro do mesmo ano as eleições para
presidente da República, Conselho Federal (o então Senado) e Câmara dos
Deputados.
Costa Porto cita ainda vários outros exemplos, como
o caso da eleição indireta do primeiro presidente da República do regime
militar, marechal Humberto de Alencar Castello Branco, pelo Congresso Nacional.
Realizado no dia 11 de abril de 1964, o pleito havia sido regulamentado quatro
dias antes pela Lei n° 4.321.
O ex-ministro lembra que, no passado, muitos outros
textos legais estabeleceram normas para eleições ocorridas no mesmo ano da
edição das leis. “Nada mais justo e conveniente, então, que, pelo menos um ano
antes dos pleitos é que se possam alterar as normas que os regulem”, conclui.
JURISPRUDÊNCIA - Em diversos julgamentos, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que o artigo 16 da Constituição Federal é uma garantia fundamental para o “pleno exercício de direitos políticos” e do “devido processo legal eleitoral” do eleitor, do candidato e dos partidos políticos. Foi isso que o Tribunal decidiu na análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3685, contra a Emenda Constitucional nº 52/2006, que acabou com a obrigatoriedade da verticalização das coligações partidárias.
Nesse julgamento, considerado um marco na
jurisprudência da Corte sobre o tema, os ministros decidiram, por nove votos a
dois, que as novas regras que colocavam fim à verticalização só poderiam ser
aplicadas após um ano da vigência da emenda, ou seja, não valeriam para as
eleições de 2006, mas a partir das eleições de 2008.
A ementa (resumo) do julgamento afirma que a
aplicação da nova regra da verticalização às eleições presidenciais de 2006,
que seriam realizadas a menos de sete meses da data do julgamento, ocorrido em
março daquele ano, “colide com o princípio da anterioridade eleitoral, disposto
no artigo 16 da Constituição, que busca evitar a utilização abusiva ou
casuística do processo legislativo como instrumento de manipulação e de deformação
do processo eleitoral”.
A ementa registra também a analogia feita durante o
julgamento entre a garantia da anterioridade tributária, prevista na alínea ‘b’
do inciso III do artigo 150 da Constituição, com o princípio da anterioridade
eleitoral. Enquanto o primeiro dispositivo “encerra garantia individual do
contribuinte”, o resumo do julgamento da ADI 3685 lembra que o artigo 16
“representa garantia individual do cidadão-eleitor, detentor originário do
poder exercido pelos representantes eleitos e a quem assiste o direito de
receber, do Estado, o necessário grau de segurança e de certeza jurídicas
contra alterações abruptas das regras inerentes à disputa eleitoral”.
LEI DA FICHA LIMPA - O mesmo entendimento foi aplicado pelo Supremo ao determinar que a Lei Complementar (LC) nº 135/2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, não poderia ser aplicada às eleições daquele ano. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 633703, por seis votos a cinco.
A ementa desse julgamento adverte que a Lei da
Ficha Limpa interferiu em uma fase específica do processo eleitoral,
qualificada na jurisprudência como fase pré-eleitoral, que se inicia com a
escolha e a apresentação das candidaturas pelos partidos políticos e vai até o
registro das candidaturas na Justiça Eleitoral. Para o STF, essa fase não pode
ser delimitada temporalmente entre 10 e 30 de junho, quando ocorrem as
convenções partidárias, já que “o processo político de escolha de candidaturas
é muito mais complexo e tem início com a própria filiação partidária do
candidato, em outubro do ano anterior” às eleições.
Esse julgamento também advertiu que “a aplicação do
princípio da anterioridade não depende de considerações sobre a moralidade da
legislação”, já que o artigo 16 da Constituição Federal “é uma barreira
objetiva contra abusos e desvios da maioria”.
Fonte: TSE
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