Desgastada pela crise nos
presídios e pela onda de ataques nas ruas, Roseana Sarney agora hesita em
deixar o governo para disputar o Senado.
Uma crise na área de segurança pública pode comprometer os planos de
qualquer governante em ano eleitoral. Em 1992, o massacre no presídio paulista
do Carandiru, uma rebelião que terminou com 111 detentos mortos, tornou-se
marca indelével na trajetória do então governador Luiz Antonio Fleury Filho,
que hoje amarga o ostracismo político. Neste ano, a grande questão no cenário
eleitoral do Maranhão é se as mortes bárbaras ocorridas dentro do Complexo
Penitenciário de Pedrinhas – com decapitações e esquartejamentos – e
fora dele, com ônibus incendiados e uma menina de 6 anos queimada viva, terão
impacto para destronar um grupo político que governa o Estado há quase meio
século.
Os três candidatos de oposição à governadora Roseana Sarney (PMDB),
filha do senador e ex-presidente da República José Sarney (PMDB), são ligados
ao Judiciário e a bandeiras dos direitos humanos. O mais conhecido deles é
o ex-juiz e ex-deputado Flávio Dino (PCdoB), atual presidente da
Embratur, que tentou unificar os partidos de oposição à gestão Roseana
numa votação plebiscitária “anti-Sarney”. Também deverão concorrer a
deputada estadual Eliziane Gama (PPS) e o advogado Luis Antonio Pedrosa (PSOL).
Os dois presidem comissões de Direitos Humanos no Maranhão – ela na Assembleia
Legislativa, ele na seção local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
A família Sarney pretende lançar na disputa Luis Fernando Silva
(PMDB), atual secretário de Infraestrutura de Roseana. A governadora conta com
o apoio do PT, que indicou o vice-governador e tem secretarias no primeiro
escalão. Porém, no próprio PT a questão é controversa. Desde 2010, parte
do diretório estadual não aceita o acordo com a família Sarney, mas a
ordem vem de cima: a presidente Dilma Rousseff exige a manutenção da aliança –
com apoio dos Sarney, ela obteve 79% dos votos no Maranhão na eleição
passada. Quando a crise no sistema prisional se amplificou, Dilma se apressou
em socorrer os Sarney: enviou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo,
ao Maranhão. A incursão de Cardozo, que apareceu nas imagens de TV ao lado de
Roseana anunciando uma parceria vaga entre os governos federal e estadual,
ajudou a aplacar a crise e tirar o Maranhão do noticiário nacional.
“O PT hoje é nosso parceiro,
tanto nacionalmente como no Estado”, afirma o líder do PMDB na Assembleia Legislativa,
deputado estadual Roberto Costa. “A possibilidade de reeditar a aliança é muito
forte.” Costa diz que a candidatura de Luis Fernando Silva terá ainda os
apoios de DEM, PTB, PSD, PV e uma série de legendas nanicas.
TRIO – Por causa da intervenção da direção nacional do
PT na disputa em 2010, o comunista Flávio Dino afirma que não mobilizará a
estrutura do PCdoB pelo apoio dos petistas. “Tem que deixar o PT decidir no
tempo dele, já que a decisão é nacional mesmo. Se o PT vier, vai ser muito
bem-vindo”, diz ele. “É uma contradição absoluta um partido que se autodenomina
dos trabalhadores apoiar o último dos coronéis brasileiros.”
Em sua conta, Dino soma o apoio dos partidos Solidariedade, PDT, PP,
Pros e o PTC, do prefeito de São Luís, Edivaldo Holanda Júnior, cuja
candidatura foi apadrinhada por ele. Em uma jogada que interfere na disputa
presidencial no Maranhão, Dino prometeu ao vice-prefeito de São Luís,
Roberto Rocha (PSB), a vaga na chapa para disputar o Senado.
RIQUEZA – Roseana afirmou em entrevista coletiva que o
Maranhão “vai muito bem” e que uma das explicações para a crise violenta é que
“o Estado está mais rico”. O governo maranhense comemorou no ano passado ter
ultrapassado, por 17 reais, o pior PIB per capita do país, ostentado agora pelo
Piauí (7.835 reais). O Maranhão tem o segundo pior (7.852 reais). Roseana
desgastou mais sua imagem ao vir à tona a informação de que ela iniciou a
compra de lagostas, uísque e caviar para o bufê do Palácio dos Leões. Das
janelas do prédio histórico, a governadora assistiu a uma passeata que pedia “a
devolução do Maranhão” – seguida de um pedido de impeachment protocolado por
advogados que militam em ONGs de Direitos Humanos.
“A violência é lamentável, mas há uma ligação direta entre o que
acontece dentro e fora da penitenciária com o sistema político implantado, que
está totalmente comprometido com o patrimonialismo”, critica Dino.
De 2010 a 2013, os homicídios em São Luís e na Região Metropolitana
aumentaram 62% - de 499 para 807 casos, no ano passado. O crack invadiu o
interior do Estado (39 cidades declaram ter nível alto de problemas pelo
consumo da droga, segundo a Confederação Nacional dos Municípios). A violência
tira a tranquilidade do hábito nordestino de sentar na frente de casa para
prosear com os vizinhos à tarde.
O funcionalismo público, principalmente no setor da Segurança, reclama
da falta de estrutura e principalmente de pessoal. O governo tenta concluir um
concurso aberto em 2012 para 2.400 vagas de policiais militares e civis. Em
meio à onda de violência, a gestão Roseana passou a exibir na TV uma propaganda
em que apresenta como inovação uma central de videomonitoramento instalada no
segundo semestre de 2013, em São Luís.
O sindicato dos agentes penitenciários (Sindspem)
aponta a terceirização como o fator que fragilizou a segurança e permitiu a
barbárie no Complexo Penitenciário de Pedrinhas. O governo maranhense
contratou duas empresas para controlar os presídios, a VTI Tecnologia da
Informação e a Atlântica Segurança Técnica – que tem como representante Luiz
Carlos Cantanhede Fernandes, sócio do marido da governadora, Jorge Murad, em
outra empresa.
O clã Sarney também enfrenta dificuldades em negociações com
parlamentares aliados. No ano passado, Roseana perdeu o ex-delegado e deputado
estadual Raimundo Cutrim, que se rebelou da base e migrou direto para a
oposição – no caso, o PCdoB. A insatisfação com o valor de emendas
parlamentares no “bloquinho”, um grupo minoritário de deputados que não
aderiram oficialmente à situação nem à situação, atrasou a votação do Orçamento
de 2014 na Assembleia Legislativa.
Até a crise chegar ao Palácio dos Leões, em janeiro,
o plano de Roseana era disputar uma cadeira no Senado,
o que a obrigaria a deixar o governo até o começo de abril, prazo exigido pela
Lei Eleitoral. Mas os planos estão parados. “Existe uma indefinição por parte
dela”, diz Roberto Costa, líder do seu partido na Assembleia. Ainda é cedo para
dimensionar o tamanho do desgaste provocado pela selvageria de Pedrinhas no
capital eleitoral dos Sarney. Mas já é possível afirmar, segundo políticos
maranhenses e assessores do Palácio do Planalto, que o grupo enfrentará sua
mais complicada eleição em décadas de hegemonia.
Fonte: Veja on-line
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