Em carta aberta, deputado do PT João Paulo Cunha afirma que, "apesar do desrespeito à legislação vigente" ao longo do julgamento da Ação Penal 470, vai "seguir a lei" e se entregar para "cumprir a injusta e absurda pena" a que foi sentenciado; mas garante que continuará lutando, "em defesa da verdade e da justiça"; ex-presidente da Câmara anuncia que sua defesa solicitará a revisão do processo e dispara críticas ao presidente do STF, Joaquim Barbosa, quem, segundo ele, "age como se fosse o todo poderoso que estaria acima da lei"; João Paulo, que teve a prisão determinada hoje, ressalta: "Tenho minhas mãos limpas"
No dia em que teve
determinada a ordem de prisão pelo relator da Ação Penal 470, Joaquim Barbosa,
o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) divulgou uma carta aberta afirmando que irá
se entregar à polícia, apesar das injustiças a que foi condenado, e ressalta
que continuará lutando "em defesa da verdade". João Paulo foi
condenado pelos crimes de corrupção passiva e peculato e cumprirá pena inicial
de seis anos e quatro meses de prisão em regime semiaberto.
"Apesar do
desrespeito à legislação vigente ao longo deste processo, vou seguir a lei e me
entregar para cumprir a injusta e absurda pena a que fui sentenciado. Continuarei
lutando, em defesa da verdade e da justiça, para que este julgamento seja
revisto", escreveu o parlamentar. No texto, ele reafirma ser inocente e
não ter cometido "os crimes pelos quais nem sequer deveria ter sido levado
a julgamento", diante das provas testemunhais que apresentou.
O ex-presidente da
Câmara anunciou também que, encerrada a fase de embargos, sua defesa solicitará
a revisão criminal de todo o processo. "Tenho minhas mãos limpas",
disse. Cunha criticou o ministro Joaquim Barbosa, quem, segundo ele, agiu de
maneira "açodada" ao decretar o fim do julgamento para ele, João
Paulo Cunha, e sair de férias sem assinar a ordem de prisão.
O ato visou
"garantir que as manchetes dos jornais e TVs, do dia 07 de janeiro, fossem
dedicadas a mais um deputado que mandou prender. E não sobre a situação caótica
no presídio de Pedrinhas e nas ruas de São Luís, no Maranhão", escreveu. O
texto é marcado por outras críticas a Barbosa: "A verdade, que a grande
imprensa finge não existir, é que o relator não segue as normas vigentes e age
como se fosse o todo poderoso que estaria acima da lei". Leia a íntegra da
carta:
Carta aberta à sociedade brasileira, em defesa da verdade e da
justiça
O Julgamento da Ação
Penal 470, muito mais do que um procedimento jurídico foi um show midiático.
Caracterizou-se pela exaustiva espetacularização de uma farsa chamada mensalão.
Um caso político usado levianamente pela oposição e pelos setores conservadores
da grande imprensa para atacar o PT e seus líderes. Crimes eleitorais foram
tratados na esfera penal, e as condenações foram abusivas, sem provas e,
também, como no meu caso, contra a farta produção de provas que confirmam a
minha inocência. A democracia brasileira foi vilipendiada com um julgamento
político, que para mim resultou numa sentença injusta e juridicamente
equivocada. E o direito legal, de todo réu, ao duplo grau de jurisdição foi
desconsiderado.
O Estado de democrático
de Direito foi desrespeitado quando se limitou o direito à ampla defesa e
quando se submeteu os réus a uma exposição permanente de ataques midiáticos
contra a sua honra e integridade moral. Assim, como esse julgamento, em suas
várias fases, desprezou as garantias legais e constitucionais, não surpreende
que os réus comecem a cumprir a sentença mesmo tendo ainda o direito a um novo
julgamento para cabíveis e legítimos embargos infringentes, como no meu caso.
Apesar do desrespeito à
legislação vigente ao longo deste processo, vou seguir a lei e me entregar para
cumprir a injusta e absurda pena a que fui sentenciado. Continuarei lutando, em
defesa da verdade e da justiça, para que este julgamento seja revisto.
Encerrada a fase de embargos, minha defesa solicitará a revisão criminal de
todo o processo, de modo a garantir um novo e imparcial julgamento.
Reafirmo que sou
inocente e não cometi os crimes pelos quais nem sequer deveria ter sido levado
a julgamento, pois apresentei farto volume de provas testemunhais e documentais
que confirmam que não cometi nenhum ato ilícito. Mantenho a determinação de provar
minha inocência, em fóruns jurídicos nacionais ou internacionais, se assim for
necessário.
Assegurei e provei que
não houve desvios de recursos públicos da Câmara dos Deputados, com a aprovação
da licitação e da execução do contrato de publicidade pelo plenário do Tribunal
de Contas da União (TCU), pela Polícia Federal e por auditoria oficial da
Câmara. Minha gestão na presidência da Câmara, no biênio 2003-2004 foi marcada
pela democracia e transparência dos atos administrativos, com a divulgação na
internet, pela primeira vez, de todos os contratos firmados.
Estou no meu quinto
mandato de deputado federal, fui deputado estadual e vereador. Em trinta anos
de atuação parlamentar jamais respondi a nenhum processo. Enfrentarei esta dura
travessia de maneira serena e de cabeça erguida, pois sei que nada fiz de
errado. Buscarei força e coragem na trajetória política de um mandato
verdadeiramente democrático e popular, em que milhares de companheiras e
companheiros militam a favor dos direitos humanos e da inclusão social.
Moro na periferia de
Osasco há 50 anos. Tenho minhas mãos limpas. Na minha vida nada foi fácil.
Trabalho desde minha infância. Engraxei sapatos, vendi sorvete, trabalhei na
feira, em loja e fui metalúrgico. Assumi meu compromisso com os pobres e
trabalhadores a partir do mundo do trabalho e da dura realidade da vida. Não
fiz da fortuna razão de minha vida e as injúrias, calúnias e humilhações que
tenho sofrido não me abatem, pois tatuei em minha alma o lema do grande Dom
Pedro Casaldáliga " Minhas causas valem mais do que minha vida ".
A primeira determinação
de minha prisão, no dia 06 de janeiro, foi mais um momento revelador da postura
autoritária que marcou a conduta do relator da AP 470 durante todo o processo.
Ele negou meus recursos sem ouvir a posição da Procuradoria Geral da República
que, nesta mesma fase processual, já se manifestou sobre outros idênticos
embargos infringentes de outros réus. Requeridos, neste contexto, também para
os casos de votação a favor do réu inferior a quatro votos.
O relator, nos últimos
minutos do expediente de seu derradeiro dia de plantão, declarou o trânsito em
julgado fatiado de meu caso e determinou o início do cumprimento da minha
sentença. Descumprindo as normas processuais, que estão longe de ser meras formalidades,
não oficiou à Câmara dos Deputados, não providenciou a carta de sentença para a
Vara de Execuções Penais, não assinou o mandado de prisão e simplesmente saiu
de férias.
Esses fatos evidenciam
que o relator agiu naquele momento de maneira açodada visando garantir que as
manchetes dos jornais e TVs, do dia 07 de janeiro, fossem dedicadas a mais um
deputado que mandou prender. E não sobre a situação caótica no presídio de
Pedrinhas e nas ruas de São Luís, no Maranhão. Uma dura realidade que, na condição
de presidente também do CNJ, buscou ocultar. O que conseguiu apenas por um dia,
já que a crise do sistema penitenciário e da segurança no Maranhão é muito
grave e dominou a pauta jornalística brasileira no mês de janeiro. Outra
possível explicação para essa conduta errática estaria na possibilidade do
relator buscar faturar politicamente sobre minha prisão duas vezes.
O relator da AP 470
condenou-me por peculato e não definiu onde, como e quanto desviei. Anexei ao
processo a execução total do contrato, provando a lisura dos gastos, real por
real. Ficará devendo essa explicação por que nunca conseguirá provar nada, pois
jamais pratiquei desvios de recursos públicos. Condenou-me por lavagem de
dinheiro sem fundamentação nos fatos, nas provas e na lei. Condenou-me por
corrupção passiva com base em um ato administrativo que assinei por dever de
ofício. Ato administrativo idêntico foi assinado pelo presidente da Câmara dos
Deputados que me antecedeu, sem que o relator tenha feito qualquer
questionamento ou reparo.
A verdade, que a grande
imprensa finge não existir, é que o relator não segue as normas vigentes e age
como se fosse o todo poderoso que estaria acima da lei. E se algo não sair como
quer, ele pressiona e consegue trocar um juiz da Vara de Execuções Penais, como
já fez nesse processo. Típica postura antidemocrática, que não respeita a
opinião divergente, como já provou inúmeras vezes ao agredir verbalmente, de
maneira destemperada, os ministros do STF que ousam confrontar sua opinião e
conduta. Um espetáculo deprimente que o relator protagoniza, ao vivo e em
cores, com sádico prazer.
Não temo enfrentar, se
for necessário, um novo julgamento na Câmara dos Deputados. Deste caso, já fui
absolvido pelo plenário da Casa e nas urnas, em duas eleições, em disputas
(2006 e 2010) marcadas pelo uso deslavado e leviano do chamado mensalão contra
o PT. Nos pleitos eleitorais sempre estimulei o debate e dialoguei com a
população, esclarecendo todos os fatos. Portanto, os mais de 255 mil eleitores
que em 2010, pela segunda vez seguida, me elegeram o deputado federal mais
votado do PT no Estado de São Paulo, fizeram-no de maneira consciente,
informados e convencidos de que jamais me envolvi em ilegalidades.
Não fugirei de minhas
responsabilidades nessa decisiva quadra da história nacional, em que se
vivencia a judicialização da política e se assiste ao aviltamento dos
princípios que estão na base do Estado de Direito Democrático. Em defesa das
prerrogativas constitucionais que garantem as competências do Poder Legislativo
para decidir sobre os mandatos de seus membros, estou preparado para o legítimo
julgamento do plenário da Câmara dos Deputados. Onde provarei, novamente, que
não pratiquei nenhuma irregularidade, sendo inocente em relação aos crimes dos
que sou acusado.
Sei que a injustiça
contra mim não é a primeira e não será a última que se comete na história. A
humanidade já viu Dreyfus ser equivocadamente condenado. E os irmãos Naves
serem torturados e condenados com o apoio da mídia e da maioria da população.
Mesmo condenado injustamente mantenho a cabeça erguida e a serenidade dos que
sabem que são inocentes e fizeram na vida a opção correta, ficando ao lado da
grande maioria do povo sofrido da Senzala, enquanto muitos poderosos, alguns
togados, escolhem servir à elite minoritária da Casa-Grande.
Ao longo do julgamento
da AP 470, por diversas vezes, o devido processo legal e o legítimo e amplo
direito de defesa foram desrespeitados por uma condução autoritária da
presidência e relatoria, que reproduziu e sustentou, praticamente na íntegra, a
frágil peça acusatória da PGR. Contribuindo diretamente para fazer um
julgamento que sem sustentação legal, desprezou fatos e provas e perpetrou
inúmeras arbitrariedades.
A começar pela
divulgação ao vivo das sessões do julgamento, expondo os réus à execração
pública, em tempo real. Este desserviço à justiça séria, imparcial e livre da
pressão da opinião pública e da opinião publicada de uma grande mídia
antipetista é uma aberração brasileira, não existindo em nenhuma das
consolidadas democracias constitucionais em todo o mundo. Pelo contrário,
nessas democracias o réu é preservado de pressões externas, sendo considerado
inocente até prova em contrário, enquanto no caso da AP 470 os réus já estavam
condenados muito antes de ocorrer o julgamento.
O fato é que cresce a
cada dia o número de ministros, ex-ministros e juízes de todos os tribunais,
advogados, estudiosos e pesquisadores que questionam a orientação jurídica e a
conduta da presidência e da relatoria do STF, no julgamento da AP 470. Quando
assistimos, ao vivo, o amplo direito de defesa ser relegado e a difusão de uma
extensa gama de mentiras. Como, por exemplo, a falsa informação de que teria
existido compra de votos no Congresso Nacional. Ou a mentira deslavada de que o
mensalão foi o maior caso de corrupção do país. Uma cantilena insustentável,
quando se sabe que houve no Brasil dezenas e dezenas de casos de corrupção, com
comprovados desvios de bilhões de reais.
Um poder judiciário
autoritário e prepotente avilta o regime democrático. Um presidente do STF que
trata um réu como se estivéssemos na idade média, tentando amordaçá-lo e
desprezando provas robustas de sua inocência, presta um desserviço ao
aperfeiçoamento das instituições democráticas do país. Um ministro do SFT deve
obrigatoriamente guardar recato, não deve disputar a opinião pública e fazer
política a partir de seu cargo. Deve ser isento e imparcial. Ter civilidade e
cortesia. Atributos que estão ausentes na postura e conduta do relator da AP
470.
Brasília, 04 de
fevereiro de 2014.
João Paulo Cunha
Deputado Federal – PT/SP
Deputado Federal – PT/SP
Fonte: Brasil 247
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