ENTREVISTA:
Fórum – O senhor tem defendido a federalização da educação, um assunto muito polêmico. As escolas federais, por exemplo, são as melhores notas do Ideb. Mas são escolas elitistas. Em muitas, senão em todas, se faz vestibular, então você já tem os melhores alunos mesmo que sejam das escolas públicas. Não é um argumento falacioso? O senhor acha possível dar a mesma qualidade a todas as escolas?
Buarque – A
federalização consiste primeiramente em constituir uma carreira nacional do
magistério que pague muito bem, e minha proposta é R$ 9,5 mil por
mês. Um salto fenomenal. Mas que se faça uma avaliação muito
cuidadosa e rigorosa. Rigorosa no sentido de escolher os melhores; cuidadosa,
incluindo entre o que é melhor a prática da pessoa de dar aula. Se a
gente paga R$ 9,5 mil e escolher só com concurso, vai ter muita gente
que vai passar no concurso odiando criança. Isso é um problema sério quando se
paga bem. A Polícia Federal está cheia de gente que odeia o trabalho.
Cientistas da UnB que foram para lá para ganhar mais estão
completamente deslocados, procurando outro emprego. Tem que ter a seleção, e
uma avaliação permanente. Isso pode ser o ponto mais difícil. Tem que se quebrar
a estabilidade plena.
Fórum – O senhor quando
saiu do Ministério da Educação tinha essa relação com a questão da
federalização?
Buarque – Tinha.
Começamos em 29 cidades um programa chamado Escola Ideal. Só que a gente
assumiu no primeiro ano, então o orçamento não comportava. Consegui
dinheiro para isso, e muito pouco, realocando de outras áreas do MEC, porque o governo federal
nunca deu qualquer dinheiro a mais pra educação no primeiro ano da gestão
porque foi o ano do aperto. Mesmo assim comecei em 29 cidades, tudo com 10 mil
habitantes, bem pequenininhas. Saí e pararam isso. Só consegui passar
o dinheiro para eles em dezembro, porque era uma quase federalização, que
passava os recursos para os prefeitos, não assumia as escolas. Mas
voltando. Esse professor, essa nova carreira, tem também a infraestrutura: tem
que ter prédio bonito, ar condicionado nas escolas… Não tem sentido morrer de
frio aqui onde você está, e eu e uma criança termos aulas a 40 graus,
às vezes com teto de zinco. É preciso pensar mais os equipamentos…
Fórum – São quantas mil
escolas no Brasil?
Buarque – São
duzentas mil escolas.
Fórum – Quantos
professores?
Buarque – São
dois milhões.
Fórum – R$ 9,5 mil cada
um?
Buarque – Hoje
vai custar 450 bilhões. Mas já se gasta 300, é uma diferença de 150. E só
vai se chegar a isso daqui a 20 anos. Não existe federalização de repente, não.
Federalização é aos poucos. E a grande sacada do programa é que você
faz aos poucos no Brasil, mas faz de imediato na cidade, adotando todas as
escolas.
Fórum – O senhor
conseguiu apresentar essas formulações para a presidenta Dilma?
Buarque – Não,
entreguei à Gleisi [Hofman] e depois ao Gilberto Carvalho. E agora,
veja bem, você vai fazendo por cidade, e tem mais: defendo que se
faça nas cidades que quiserem. Voluntariamente. Se não quiser ser federalizada,
não tem problema. Só que quando começar, ninguém para. O problema vai ser o
contrário: definir critérios para não pegar todas, pois não se tem
fôlego. O problema não é dinheiro, o Brasil tem mais de R$ 4
trilhões. Mesmo que fosse hoje, R$450 bilhões já é um
montante que está dentro dos 10% do PIB. Apesar de ainda
precisar incluir nesse total os gastos com universidades, a
minha proposta é fazer isso em 20 anos. Vai sendo criado o
novo sistema e desmontando o sistema tradicional.
Se houver um crescimento médio do
PIB de 2% ao ano, o que não é muito para a história do
Brasil, esses R$ 450 bilhões vão corresponder a 6,4% do PIB. Por isso que não
entrei na briga de 10% do PIB no Plano Nacional de Educação. Achei que
esta era uma luta irrelevante. Até porque se você usar 10% do PIB no
sistema de hoje, está jogando dinheiro fora. E, se jogar dinheiro fora
hoje, não vai conseguir fazer isso nunca mais. Por exemplo, esse salário
de R$ 9,5 mil é para um professor de uma nova carreira. Se a gente
der 10% do PIB hoje, é capaz de aumentar esse valor para os professores
de agora, e aí o impacto vai ser muito pequeno na qualidade da educação.
Fórum – O senhor
acha que alguém ganhando mais acaba criando um nível de comprometimento um
pouco maior…
Buarque – Não,
não. Ganhando mais, não. Mas triplicando, sim. Tem que aumentar o
salário, é ridículo o salário dos professores atuais. Mas pagar R$
9,5 mil aos atuais não dará o impacto que se espera.
Fonte: Blog do Varão
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