Líder nas pesquisas ao
governo do Maranhão fala da campanha anticomunista contra sua candidatura e
afirma que, caso eleito, buscará rede de proteção para evitar eventuais
sabotagens do grupo de Sarney
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Líder nas pesquisas é vítima de campanha anticomunista |
Os
seis partidos brasileiros que trazem os termos “socialismo” ou “comunismo” no
nome têm pouca fidelidade aos princípios marxistas. O candidato à sucessão de
Roseana Sarney ao governo do Maranhão, Lobão Filho, procura, contudo, alimentar
um suposto temor do eleitorado local com o risco da instauração de uma ditadura
do proletariado no estado caso Flavio Dino, do PCdoB, seja eleito governador.
Dominado há quase 50 anos pelo mesmo grupo político, salvo breves períodos de
interregno, o estado parece estacionado naquele mesmo ponto em que José Sarney
o conquistou: 1966, tempos da Guerra Fria.
A campanha anticomunista, reforçada em panfletos,
inserções em rádios e televisão e até mesmo em debates entre os candidatos,
parece ser a estratégia prioritária da campanha do filho do ministro de Minas e
Energia, Edison Lobão. Segundo dois institutos de pesquisa maranhenses, o
peemedebista está a mais de 30 pontos do líder Flavio Dino, do PCdoB.
O instituto Ibope, em parceria com a TV Mirante,
afiliada da Globo no estado, sob o comando da família Sarney, afere uma
vantagem bem menor para Dino: 12 pontos. Vale a ressalva: o instituto costuma
cometer erros nas eleições estaduais. Por duas vezes, cravou a vitória de
Roseana no primeiro turno e foi desmentido pelas urnas. Sua parceria com a TV
Mirante também não confere credibilidade. Em uma entrevista em 22 de agosto,
Dino foi questionado em uma entrevista ao canal se “iria implantar o comunismo
no Maranhão.”
Em entrevista a CartaCapital,
Dino afirma que a entrevista foi a maior surpresa de sua campanha até o
momento. “Parecia um inquérito do DOI-Codi”, compara. Além de criticar a
estratégia da qual tem sido alvo, o candidato apresenta algumas de suas
propostas para o estado, cujo índice de desenvolvimento humano é um dos piores
do País. Ex-juiz federal, o candidato diz que irá investir em parcerias com
entidades da sociedade civil para garantir uma rede de proteção contra o
poderio midiático e econômico de Sarney no estado. Embora o PCdoB faça parte do
governo Dilma, Dino prefere não declarar seu voto à presidente. O objetivo é
manter a harmonia em sua chapa, cujo vice é do PSDB e o candidato ao Senado, do
PSB. “Nesse caso, o voto secreto é um direito constitucional”, brinca.
CartaCapital: O senhor tem sido alvo de uma campanha no estado
para associa-lo ao comunismo e ao ateísmo. Como o senhor interpreta esses
ataques?
Flávio
Dino: Foi uma aposta errada que fizeram. É reveladora a
falta de discurso do PMDB. Eles não têm o que dizer, não têm um programa para
apresentar. É um discurso gelatinoso. Nem a continuidade com o grupo de Sarney
o Lobão Filho assume. Então apostaram nessa linha de agressão pessoal e
tentaram criar essa dicotomia no debate público. Chega a ser risível: ao invés
do anti-sarneyzismo, eles acharam que o anticomunismo poderia ser a pauta
principal das eleições. Na sociedade, essa agenda não existe. Tentaram
implantá-la de uma forma muito baixa, inclusive com o próprio José Sarney como
líder, algo que me chamou a atenção. Ele próprio escreveu um artigo sobre o
tema, e seu jornal, O Estado
do Maranhão, usa imagens de
comunistas perseguindo crianças. Sem contar a entrevista para TV Mirante, em 22
de agosto. Minha maior surpresa nas eleições até o momento foi aquela
entrevista. Não imaginava uma entrevista de sete minutos similar a um
interrogatório do Doi-Codi. Com o PCdoB sendo legalizado há 30 anos, eu jamais
imaginei essa postura, assumida por orientação dos donos da emissora. O mais
grave dessa aposta é que é fascista. Eles não se dão conta do que significa uma
disputa política baseada no ódio. As grandes tragédias da humanidade surgiram
desse incitamento ao ódio. O nazismo é o exemplo máximo.
CC: O senhor conta com uma coligação ampla, com 9
partidos de espectros distintos. O senhor tem formalmente em sua base o PSDB e
o PSB, ambos com candidatos relevantes à presidência. O elo entre esses
partidos no Maranhão é o sentimento anti-Sarney?
FD: Sim, essa é a liga principal. São 49 anos de um poder quase
ininterrupto, a partir da eleição de José Sarney como governador. Na
ditadura, ele governou com todos os generais e foi presidente da Aliança
Renovadora Nacional. Era de se esperar que, a exemplo de outras figuras do
período, houvesse uma diminuição de seu poder com a chegada do regime
democrático. Mas, pelo contrário, ele tornou-se presidente da República, e
depois um senador com muito poder em praticamente todos os governos. Desde
Itamar Franco, sempre houve um nome vinculado à Sarney em algum ministério:
Alexandre Costa, ministro da Integração Regional de Itamar, Zequinha Sarney,
ministro do Meio Ambiente no governo Fernando Henrique, e agora Edison Lobão,
chefe da pasta de Minas e Energia de Lula e Dilma. Mas na política o princípio
da ação e reação de Newton também se aplica. Do outro lado, formou-se um
sentimento de que é preciso dar um fim a esta concentração de poder. Foi o elo
que uniu tantos partidos de trajetórias diferentes. Em comum, todos nós
participamos da vitória do Jackson Lago, do PDT, em 2006. E há outro elemento,
que me faz lembrar o livro “O Papel do Indivíduo na História”, de Georgi
Plekhanov: o fato de que eu, meu vice Carlos Brandão, do PSDB, e o candidato ao
Senado Roberto Rocha, do PSB, nos tornamos deputados federais nas mesmas
eleições, em 2006. Essa experiência em comum nos aproximou politicamente.
CC: José e Roseana Sarney decidiram não concorrer este
ano, mas é difícil imaginar que não continuem a participar ativamente da vida
pública, por meio da TV mirante e dos jornais locais, além da influência que
demonstram possuir no judiciário local. O ex-governador Jackson Lago teve seu
mandato cassado em 2009 por abuso de poder econômico e político, em um processo
bastante polêmico. Qual será sua estratégia para não sofrer com a pressão dos
Sarney no governo, caso eleito?
FD: A sua premissa está correta. De fato, eles vão preservar uma fatia de
poder, mesmo com uma derrota eleitoral. O prognóstico é de que haverá algum
conflito. A nossa expectativa é fazer muitas parcerias com o governo federal,
prefeituras e a sociedade, igrejas e sindicatos, para criar uma rede de
proteção para uma experiência republicana no Maranhão, para prevenir essa
capacidade de sabotagem demonstrada durante o mandato de Lago. A experiência
histórica é relevante. E há também a minha experiência pessoal de ter sido
deputado federal, ter participado do governo federal e possuir experiência como
juiz federal. Eu conheço profundamente o judiciário local.
CC: O que o senhor propõe para alavancar o crescimento
econômico do Maranhão? O estado cresceu bastante nos últimos anos, mas o PIB
percapita é um dos piores do País. Qual deve ser o modelo de crescimento?
FD: Há uma nítida diferença entre o nosso modelo e o de Lobão Filho. Eles
defendem o que chamamos de economia de enclave. Desde a chegada de José Sarney
ao poder no estado, havia a concepção de que grandes projetos iriam gerar um
efeito “pedra no lago” na economia. Isso revelou-se um retumbante fracasso.
Todos os grandes projetos prometidos transformaram-se em frustrações
gigantes. O projeto da estrada de Ferro Carajás, embora muito importante
para o estado, seria muito mais relevante se agregasse valor. O Maranhão é
praticamente o ponto de passagem do trem. E grande parte do estado fica a ver
navios, pois apenas explora-se o minério de ferro em seu estado bruto. Outro
exemplo é a Base de Alcântara, o programa está muito lento desde a explosão
ocorrida no início do governo Lula. O Polo de Confecções de Rosário foi uma
grande iniciativa, mas não funciona devidamente. E agora temos o caso da
refinaria da Petrobras, que acabou de refinaria “premium” à delação premiada.
Essa economia de grandes projetos revelou-se incapaz de garantir justiça social
e desenvolvimento, que é diferente de crescimento. O primeiro passo é gerar
empregos a partir dessa economia primária, com efeitos no comércio e nos serviços.
Em segundo lugar, chegar à agroindústria, ao proporcionar agregação de valor do
setor primário, e explorar nossas vantagens logísticas. Estamos em um ponto
estratégico entre as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, temos uma
integração ferroviária e rodoviária de grande importância, e temos em termos
potenciais o melhor porto do Brasil. É a primeira parada de quem vem do canal
do Panamá e a última de quem está indo para o Pacífico. Na China e Índia, são 2
bilhões de pessoas para serem alimentadas, e o caminho mais perto para esses
grandes centros é o Maranhão. Precisamos utilizar essa localização geográfica
para atrair empresas e investimentos que olhem para o Mundo e revitalizar
aquele passado que fez a região ser disputada por portugueses, holandeses e
franceses há séculos atrás.
CC: Metade da população maranhense não tem acesso à
água tratada e 90% não têm tratamento de esgoto. A que fatores o senhor atribui
tamanho déficit na oferta de água à população? É um problema meramente
político, ou há deficiências técnicas para captação de água potável no estado?
FD: Não há qualquer problema técnico. Há fontes abundantes de água, de
superfície e subterrânea. Ao longo do tempo, esse modelo patrimonialista
perverso aparelhou a Companhia de Águas do Estado, a Caema, e a transformou em
uma fonte de negócios. Ao invés de jorrar água, jorra dinheiro. A empresa
depreciou-se e perdeu sua capacidade de investir. Há um conjunto de soluções
disponíveis, desde a captação da água da chuva, até poços artesianos e adutoras
para captar água dos rios. São uma infinidade de soluções para atingir a meta
de universalizar o acesso. A falta d’água, além de gerar problemas de saúde,
gera depreciação de qualidade vida. Quem carrega água a vida inteira para casa
são em sua maioria mulheres, desde meninas a idosas. É um serviço que não
acaba.
CC: Após o episódio de esquartejamento no complexo de Pedrinhas, no início
do ano, os altos índices de violência no estado foram abordados pela mídia
nacional. Há um aumento de 200% no número de homicídios na última década. Como
o senhor interpreta a escalada da violência no estado?
FD: Em primeiro lugar, os indicadores sociais negativos. Em segundo, a
chegada com força do tráfico de drogas do Maranhão e em terceiro, a
incapacidade dos governos sucessivos de redimensionar a polícia à altura do
desafio. O Maranhão não tinha uma tradição há 20, 30 anos atrás de
criminalidade endêmica, você tinha uma criminalidade eventual, crimes
passionais, do patrimônio. Muito rapidamente a criminalidade mudou seu perfil e
a polícia não acompanhou. Temos de enfrentar o problema com duas mãos.
Primeiro, dar oportunidade, fazer inclusão social, esportiva e cultural. Por
outro lado, é preciso que a polícia tenha uma presença significativa no estado.
Hoje temos a pior relação policial por habitante do País. Temos de aumentar o
contingente. E para que esse aumento quantitativo seja acompanhado de um
aumento da qualidade, estamos nos comprometendo com o modelo implantado por
Eduardo Campos em Pernambuco, um arranjo institucional chamado Pacto pela Vida,
em que se articula todas as forças, não só as policiais mas as do sistema de
Justiça, Defensoria Pública e Ministério Público, em uma espécie de gabinete
permanente de acompanhamento das estatísticas, que fixa metas regionalizadas e
monitoradas pelo governador. No caso de Pernambuco deu muito certo, pois
cria-se uma referência de autoridade. Hoje, não existe isso no Maranhão.
Imagine a dificuldade de um conjunto de políticos que são permanentemente
acusados de cometerem crimes de conseguir emular credibilidade e seriedade em
seu compromisso de combate ao crime. É uma contradição tão absurda que eles
perdem a capacidade de liderar as forças de segurança.
CC: Os conflitos entre índios, posseiros e madeireiros no estado têm crescido
nos últimos anos. Como será a política indigenista de seu governo?
FD: A política indigenista no Brasil depende muito pouco dos governos
estaduais. Como as terras indígenas são da União, e a política indigenista é
uma competência federal, o papel do estado é de suporte. Eu creio que o governo
deve ser uma instância de mediação e identificação de conflitos, que vise
compatibilizar a política de proteção. Acredito que a Constituição está correta
e temos uma dívida para com essas comunidades. Mas por outro lado esse processo
não pode ser feito na marra. Às vezes as intervenções são muito abruptas. Eu
acredito em soluções negociadas. Nós temos áreas no Maranhão onde as pessoas
estão produzindo há 20, 30 anos. Então você não pode tratar um posseiro como se
ele fosse um criminoso. Para além dessa questão das terras, o governo do estado
terá compromisso com a melhoria da qualidade indígena no que se refere a
serviços. A pobreza é inacreditável nessas comunidades.
CC: O senhor propõe um Mais Médicos estadual, com a
criação de novos cursos de medicina e de uma carreira estadual. O Mais Médicos
deve ser um modelo para os governos do Norte e do Nordeste?
FD: O Mais Médicos atende
a uma necessidade. Alguns criticam que não é o ideal. Para mim, que sou
católico, ideal mesmo é apenas o reino de Deus. O resto são soluções
contingenciais. No Maranhão, o Mais Médicos respondeu a uma carência crônica na
atenção básica. Hoje, os médicos cubanos fazem um grande trabalho. Assim como o
Bolsa Família, o Mais Médicos é em certo sentido uma política compensatória.
Mas é preciso também estimular uma visão estruturante. Há cinco cursos de
medicina no estado, dois deles recentemente criados. Temos de ampliar as vagas
de residência médica, pois hoje há uma defasagem. Nós temos 380 formandos por
ano e 110, 120 vagas de residência. Isso também expulsa profissionais. Se
houver um bom programa de residência médica, ele fixará e até atrairá
profissionais de outros estados. Propomos também a carreira estadual.
Precisamos ter um corpo especializado com dedicação exclusiva nas principais
unidades do Maranhão. Nós temos um baixo investimento em saúde, o que é um
problema nacional, mas temos uma sangria de desperdício de recursos públicos
destinados à pasta. No maranhão é um escândalo. Não posso falar de
subfinanciamento enquanto não se corrigir os abusos, de uso de helicóptero e de
avião para transportar secretários e autoridades, de obras inacabadas pelo
estado todo, de hospitais fechados e construídos com superfaturamento.
CC: O senhor conta em sua coligação com o PSB e o PSDB. Em tese, o PT apoia
a candidatura de Lobão Filho, como manda a direção nacional. Mas a propaganda
de televisão de sua candidatura coloca os petistas como um dos que abraçam sua
coligação. Como explicar esse paradoxo?
FD: A maioria do PT está
comigo. Quem está com Lobão filho é o PT cartorial, a sigla. O que restou de
militância do partido do Maranhão, ficou com a gente. A Federação dos
Trabalhadores de Agricultura do Maranhão, a principal entidade dirigida pelos
petistas no estado, está conosco. Lideranças tradicionais ou saíram do PT, ou
estão lutando conosco.
CC: O senhor apoia formalmente algum dos presidenciáveis?
FD: Não. Nós fazemos uma espécie de condomínio. Em cada local as lideranças
manifestam seu apoio, e às vezes o Carlos Brandão pede voto para o Aécio, o
Roberto Rocha pede voto para Marina. Depende da cidade e a quem a liderança
local apoia. Recentemente, fizemos uma caminhada em Caxias, havia bandeiras
minhas, do Roberto e da Dilma, pois era a opção da liderança local. Eu não
manifesto meu voto. No meu caso, o voto secreto é uma garantia democrática
(risos).
CC: as denúncias do ex-diretor da Petrobras, Paulo
Roberto Costa, de um suposto esquema de propinas em contratos com a estatal
atingiram Edison Lobão e Roseana Sarney, seus adversários políticos. Mas também
envolve o PSB, que está na sua base, e o PT, a quem seu partido apoia no plano
nacional. Qual o impacto que a denúncia terá na campanha pelo governo do
estado?
FD: Há um forte impacto local. É uma agenda real, em razão da refinaria de
Bacabeira. Em 2010, o discurso da campanha de Roseana foi todo montado ao redor
da refinaria. O diretor responsável pelas obras era o próprio Paulo Roberto
Costa. Há fotos com ele, Roseana e Lobão inspecionando as obras, em eventos.
Então o link dessa questão nacional é muito forte no estado. Em temos mais
amplos, acho que o melhor para o sistema político seria o depoimento de Costa
ser revelado. Primeiro porque o sigilo torna-se ficcional, por causa dos
vazamentos seletivos. Independente do caso da Maranhão, a medida mais salutar
para garantir eleições limpas, em um clima de mais racionalidade, seria a
revelação do teor do depoimento. É muito verossímil que Lobão e Roseana tenham
se beneficiado do esquema. Tem uma parelha jurídica que não sei dizer em latim,
pois não sou disso, mas sempre dizia aos meus alunos em sala de aula: “indícios
vários e concordantes constituem provas”. O doleiro Alberto Youssef foi preso
em São Luís ao carregar uma mala de dinheiro para corromper um funcionário do
governo estadual. Então aparece Costa, que afirma participar, ao lado do
doleiro, de um esquema de pagamento de propinas a políticos, e cita Lobão e
Roseana. O impacto nas eleições locais será grande. No sentido da rejeição do
grupo deles, e do aumento da virulência. A reta final deve ser marcada por
muita baixaria.
Fonte: Carta Capital